Aos 16 anos, Pedro Andersson descobriu o jornalismo na Rádio Clube da Covilhã. Seguiram-se a licenciatura em Comunicação Social, na Universidade da Beira Interior, a passagem pela TSF e, em 2000, o desafio de integrar a equipa fundadora da SIC Notícias. Desde então, construiu carreira na televisão, sempre com o objetivo de traduzir temas complexos em linguagem clara.
Foi esse impulso que, em 2011, deu origem à rubrica Contas-poupança, na SIC. O espaço televisivo abriu caminho para livros, podcasts e milhares de seguidores nas redes sociais. Andersson tornou-se uma voz da literacia financeira em Portugal.
É neste percurso que se inscreve Contas-poupança – As Melhores Dicas (edição Contraponto), novo livro que chega às livrarias a 18 de setembro. A obra reúne o essencial da experiência de 15 anos a acompanhar as dúvidas e os problemas financeiros de milhares de famílias portuguesas. Este título apresenta uma síntese organizada e atualizada, complementada com conteúdos inéditos.
Estruturado em formato de guia prático, o livro procura responder a questões concretas: como negociar um crédito à habitação, baixar prestações mensais, escolher um seguro de saúde vantajoso, aumentar o reembolso de IRS ou eliminar comissões bancárias. Inclui ainda instruções passo a passo para quem começa a gerir um orçamento pela primeira vez, exemplos de utilização de aplicações financeiras para rentabilizar pequenas poupanças e orientações para imigrantes que se instalam em Portugal e precisam de entender o sistema bancário e fiscal.
Andersson introduz também novos temas que refletem preocupações atuais, como estratégias para lidar com o aumento do preço da habitação ou critérios para avaliar seguros sem perder coberturas essenciais.
Do livro, publicamos o excerto abaixo:
Será que tem a casa paga e não sabe
Apesar de não ser um concurso, o Contas‑poupança já “deu” várias casas a espetadores atentos. O melhor prémio que podemos receber pelo nosso trabalho é melhorar a vida dos outros, sobretudo se tivermos em conta que estamos a ajudar pessoas que viram a sua vida desabar por causa de uma doença muito grave. Dentro da tragédia, acaba por ser uma boa notícia.
São pessoas que têm um seguro de vida associado ao crédito à habitação com a cobertura ITP. Na eventualidade de ter um problema de saúde grave e incapacitante, se acionar o seguro, a seguradora paga ao banco o valor ainda em dívida. Por outras palavras, fica com a casa totalmente paga. É menos uma preocupação.
Um desses casos foi o de Daniel Pedrogam, que, depois de ter visto a reportagem do Contas‑poupança na SIC acerca da renegociação do crédito à habitação, contactou uma das empresas referidas para baixar o seu spread. E qual não foi a sua surpresa quando lhe disseram que, na verdade, a casa já deveria estar paga pelo seguro de vida.
Daniel era funcionário da Câmara Municipal de Lisboa. No entanto, em 2013, um problema de saúde veio interromper‑lhe a carreira. Pediu o Atestado Médico de Incapacidade Multiúso e foi‑lhe atribuído um grau de incapacidade definitivo de 80%.
Com base na informação que lhe deram na empresa de renegociação de créditos, Daniel acionou o seguro de vida junto do banco. Depois de muitas voltas e reviravoltas, este espectador acabou por perceber que precisava de estar reformado por invalidez para o seguro lhe pagar a casa. Apresentou à Segurança Social o pedido de reforma com 80% de incapacidade e, passados dois anos, recebeu resposta positiva. No final de 2018, ficou com a casa paga.
Para Daniel, o que mais lhe custou aceitar foi o facto de, quando foi ao banco, munido do Atestado Multiúsos com 80% de incapacidade, pedir uma bonificação no spread, ninguém o ter avisado sequer da possibilidade de o seguro lhe pagar a casa. Por outro lado, da primeira vez que foi à Segurança Social, também lhe foi dito que não teria direito à Prestação Social para a Inclusão, quando na verdade tinha.
Se tem uma incapacidade comprovada, ou conhece alguém que tenha, verifique se tem direito ao Atestado Multiúso e, se a incapacidade for superior a 66% (em algumas seguradoras é a partir dos 60%), pondere se vale a pena pedir a reforma. Se o pedido for deferido, poderá acionar o seguro de vida que lhe pagará o valor em dívida nesse momento ao banco, caso o seu seguro seja ITP (atenção que o IAD não paga nada). Há seguros que não exigem que fique reformado, por isso, tente sempre.
Outro dos casos foi o de Pedro Martins, diagnosticado com um problema evolutivo na visão, que, infelizmente, o deixará cego e com mais de 70% de incapacidade. Graças ao aviso de um amigo, viu a reportagem do Contas‑poupança sobre seguros de vida e créditos à habitação e ficou a saber que o seguro de vida do crédito à habitação podia pagar o valor ainda em dívida ao banco no caso de ficar incapacitado para o trabalho. Na altura nem sequer sabia a diferença entre o seguro “bom” (ITP) e o seguro “mau” (IAD).
Disse‑me o Pedro que agora ficou fã do Contas‑poupança e não perde um episódio da rubrica. A expressão que utilizou, e com a qual concordo em absoluto, é que “Informação é poder”. É mesmo. Agora, mesmo perante o cenário mau em termos de saúde, tem menos uma preocupação. No caso de Pedro, ao acionar o seguro (que felizmente é o ITP), a seguradora vai pagar 90% do valor em dívida, porque os restantes 10% estão relacionados com a mulher. Este detalhe é muito importante.
A percentagem do seguro de vida é muito importante
Em muitos casos, o cliente até faz o seguro de vida ITP, mas, para poupar, aceita que seja apenas a 50% do valor em dívida.
Quando faz um seguro para o casal, tem várias opções ao seu dispor:
– Seguro a 100% só para uma pessoa. Assim, em caso de morte ou de incapacidade de 66% (dependendo da apólice) desta, a casa fica paga; no entanto, se acontecer alguma coisa à outra pessoa, terá de continuar a pagar o empréstimo;
– Seguro a 50% do valor em dívida para um ou para os dois. Ou seja, em caso de morte ou incapacidade de um dos membros do casal, o seguro só paga metade do valor em dívida ao banco, tendo o sobrevivente de pagar a outra metade ao banco;
– Seguro a 100% para os dois membros do casal, que é a situação que protege ambos em caso de fatalidade.
Se já não tem guardado o documento com as condições da sua apólice, peça ao seu banco ou seguradora uma segunda via para analisá‑las ao pormenor e, se for o caso, alterar o seu seguro antes que aconteça alguma coisa (mesmo que fique a pagar um pouco mais).
Para rematar este tema, deixo‑lhe mais um caso extraordinário de um espectador que pediu para não ser identificado. Apesar de ter tido um cancro que o deixou com 80% de incapacidade, ainda trabalha. Depois de ter visto a reportagem do Daniel Pedrogam, perguntou ao seu banco se também teria direito a ficar com a casa paga. Como o seguro dele era o IAD (o “mau”), não tinha.
Mas, ao contrário do que aconteceu a Daniel, houve um pormenor que fez toda a diferença. O funcionário do banco (neste caso o Montepio) disse‑lhe que havia uma esperança. É que, ao que parece, os associados da Mutualista têm automaticamente um seguro de vida só por serem associados e que cobre esta situação. (Se é cliente do Montepio, confirme junto do seu gerente de conta.) Ou seja, inesperadamente, o seguro de vida que não sabia que tinha foi acionado e em poucos dias responderam‑lhe que tinha a casa paga: 60 000 €.
Estão a imaginar a alegria do homem? Ele nem queria acreditar quando recebeu a chamada do funcionário do banco. Por isso, se é cliente do Montepio e tem uma incapacidade comprovada com Atestado de Incapacidade Multiúso, mexa‑se. Pode ter a sua casa paga, como este espectador.
Dica Contas‑poupança
Na altura de fazer um crédito à habitação, peça simulações para fazer um seguro de 100% para cada um, mas com apólices diferentes. Assim, se um membro do casal ficar incapacitado, a casa fica paga, mas a segunda apólice continuará válida. Ou seja, se o outro também ficar incapacitado (ou em caso de morte), recebe novamente o valor que estiver na apólice. Se só tiverem uma apólice, ao acioná‑la a primeira vez, ela extingue‑se naturalmente. Ao fazer duas apólices, pode ter de pagar um pouco mais, mas na eventualidade de acionar a primeira, em caso de segundo infortúnio, recebe logo mais 100 000 € ou 200 000 € (ou o valor que decidirem), mesmo tendo a casa já sido paga ao banco.
Como já referi atrás, por vezes não sabemos os seguros de vida que temos e, pior, pagamos o que nos dizem para pagar sem fazermos a menor ideia de para quê. E há pessoas que até podem ter um grau de incapacidade superior a 60% que lhes vale ter a casa paga pelo seguro do crédito à habitação ou outro valor qualquer em seguros de vida que estão a pagar e nem sequer sabem disso.
Normalmente, numa situação de doença grave, ninguém se preocupa em acionar qualquer seguro que seja, mas isso não faz sentido. Caso aconteça o pior, há que manter a cabeça fria, ser racional e contactar logo que possível a seguradora. É para isso que o seguro serve: para o proteger nas fatalidades.