Na primeira faixa de “Play”, seu oitavo álbum de estúdio, lançado sexta-feira, Ed Sheeran canta um verso sobre questões que o atormentaram nos últimos anos, incluindo a perda de dois amigos, o susto da esposa com o câncer e as contestações jurídicas aos seus créditos como compositor. Mas em “Opening”, ele também se vangloria de seus sucessos, sua influência e o que parece ser uma leve cautela em relação aos “substitutos” que surgem logo abaixo dele.
Em uma conversa semana passada no Popcast, programa de música do The New York Times, Sheeran foi um pouco mais generoso sobre as gerações de cantores pop masculinos que surgiram.
— Acho ruim encará-los como algo que invade seu espaço, porque meu espaço é meu espaço — disse.
Ele não está pronto para ceder. “Play” é o raio de sol após um período nublado de anos emocionalmente baixos para Sheeran, que o levou a produzir algumas das músicas mais sombrias de sua carreira. O novo álbum retorna ao otimismo radiante de Sheeran, com canções melancólicas como “Camera” e “In other words”. Elas lembram seus hinos “Perfect” e “Thinking out loud”, que o tornaram um artista pop definidor da era moderna.
Ed Sheeran — Foto: Jeremy Liebman/The New York Times
“Play” também inclui a primeira incursão de Sheeran na música com influência persa (“Azizam”) e sua primeira música em colaboração com compositores indianos (“Sapphire”), após colaborações anteriores com artistas nigerianos e ganeses. E se essas músicas não fizerem tanto sucesso quanto outras que ele já tem no currículo, é um baque que ele está disposto a suportar.
Estes são trechos editados da conversa com Sheeran.
Jon Caramanica: Quando conversamos há uma década, você disse o quanto ama estatísticas e o quanto estava focado nesse aspecto do negócio. Você ainda tem uma visão granular das paradas, dos dados de streaming?
Acho que tudo isso estava ligado ao fato de eu ser um nerd bastante impopular na escola, que tocava músicas de que todos zombavam. Ninguém nunca imaginou que eu faria sucesso. Então o sucesso começou a acontecer e fiquei obcecado com o fato de que ele estava ficando cada vez maior. Tudo o que eu estava fazendo parecia estar funcionando, e eu estava indo cada vez mais longe. Aí você meio que pode seguir em frente.
Coscarelli: Seus últimos singles não alcançaram o Top 40 nos EUA. Você pensa: “Só preciso de mais um Top 40, mais um Top 10”, ou já perdeu essa ideia?
Eu meio que quero explorar novos caminhos na minha carreira, em vez de viajar pelas mesmas coisas, mesmo sabendo que elas iriam dar certo. Tenho duas filhas pequenas. Tenho uma família, uma esposa, um lar. Pop é coisa de gente jovem, e você tem que realmente estar presente e querer isso. Tenho me pegado cada vez mais me afastando e pensando: “Na verdade, estou realmente valorizando a família”. Hoje deixei minha filha no primeiro dia de aula dela.
Coscarelli: Em “Opening”, uma das coisas que você diz é “Eu olho para baixo e vejo alguns substitutos vindo atrás de mim”. Estamos em um momento em que o cantor e compositor masculino está em ascensão. Alguma inveja?
Isso acontece todos os anos, aliás, desde que fiz sucesso. Lembro-me de ter feito sucesso com “+”, e então Shawn Mendes lançou “Life of the party”, e de repente ele era o novo cantor e compositor. Convidei John Mayer para um show naquela época, e ele disse: “Quando eu tinha a sua idade, as pessoas sempre diziam que um dia alguém faria o que eu fazia, mas diferente. Quero que você saiba que estou reconhecendo que é você e estou muito feliz por você. E estou aqui para o que precisar”. E senti isso também em Elton John. Ele está sempre celebrando novos artistas que surgem. Desde então, sempre tentei acolher as novas pessoas.
Coscarelli: Você perdeu seu amigo Jamal Edwards alguns anos atrás e passou por um período de depressão. Quando conseguiu superar esse luto?
Eu tive que lidar com isso por um tempo, e então a Cherry (esposa de Sheeran) recebeu o diagnóstico de câncer, e em seguida o processo judicial começou, e aí meu amigo Shane também morreu. Daí fui direto para o nascimento do meu segundo filho, depois para a turnê, e depois para a cirurgia da Cherry para remover o tumor. Então fomos direto para “-”. Eu diria que foram dois anos de verdadeira nebulosidade.
Caramanica: Isso explica o brilho deste álbum?
Sim, 100%. Esta é uma reação totalmente impulsiva, tipo: “Este tem que ser o disco Technicolor mais brilhante que podemos fazer”.
Coscarelli: Você tem sido alvo de acusações de que sua música plagiou Marvin Gaye, entre outros. E deu crédito ao TLC em “Shape of You”. Vocês chegaram a um acordo.
Chegamos a um acordo em um caso, e é por isso que todos os outros casos vieram. Eu segui conselhos no primeiro, e foi aí que os outros casos vieram. Todo mundo faz acordos nos bastidores. Não é bom para relações públicas ser chamado de ladrão publicamente, e essa mancha estará lá para sempre pelo resto da minha vida. Mas não posso simplesmente jogar dinheiro fora e fazer acordos pelo resto da minha vida, então tive que cortar o mal pela raiz.
Coscarelli: Por que você sentiu que precisava levar isso a julgamento, colocando você e sua composição em risco dessa forma?
Porque não fiz nada de errado. Não foi algo divertido de se fazer, mas definitivamente alcançou algo positivo.
Coscarelli: É verdade que agora você se grava compondo tudo?
Faço isso desde 2017, então desde o segundo processo judicial.
Coscarelli: Como defesa preventiva?
Sim, e ajuda. Recebemos reclamações e você simplesmente envia todas as imagens brutas.
Coscarelli: E então você nunca mais ouve falar deles.
Caramanica: Você acha que isso é, na verdade, um ataque a toda a sua arte que eles estão tentando invalidar? Não apenas: “Ei, você roubou esse trecho dessa música”, mas também: “Esse cara não pertence a esse espaço?”.
Honestamente, acho que “Perfect” surgiu desse cenário. “Thinking out loud” era minha maior canção de amor na época, e aí aconteceu aquele processo, e eu queria provar que podia fazer de novo, mas sozinho — sem coautoria. Vou compor uma música, 100% eu, vou lançá-la e ela vai fazer o mesmo sucesso.
Acho que na minha carreira muita gente se pergunta: “Por que diabos ele está indo bem?”. Acho que as pessoas ficam confusas com isso, e talvez seja daí: “Bem, você deve ter roubado alguma coisa para chegar nessa situação.”
Caramanica: Você também diz na música de abertura: “Eu tive minha cota de ridículo, e nunca fui o mais descolado, mas estou por aqui há mais tempo”. Estamos falando do 14º ou 15º ano da sua carreira, e isso ainda é algo que você sente que precisa dizer.
Eu ainda sou motivo de piadas. Quando “Bad Habits” foi lançado, ninguém gostou. Quando “Shivers” foi lançado, ninguém gostou. Só depois de cinco anos é que as pessoas pensam: “Ah, na verdade era uma música pop boa”.
Coscarelli: Como seria para Ed Sheeran não ser saco de pancadas entre os fãs de música?
Eu estava pensando no Chris Martin recentemente e acho que, em algum momento, você transcende tudo isso. O Coldplay foi saco de pancadas por anos, e eu sou um grande fã de Coldplay. Acho que chega um ponto na carreira — Phil Collins definitivamente chegou lá — em que você transcende, e eu ainda não cheguei lá. Acho que pode haver um elemento disso, mas, eventualmente, você simplesmente precisa sobreviver.