Em declarações à agência Lusa, Carlos Cortes considerou a decisão “absolutamente lamentável”, sublinhando que “a Ordem dos Médicos censura qualquer tipo de intervenção colocada, logo à partida, desta forma”.

“Em primeiro lugar, temos de garantir sempre a segurança clínica”, que não deve ser imposta “por decreto”, mas com a tomada das opções técnicas mais adequadas.

O bastonário defendeu que é necessária uma reorganização das urgências de ginecologia obstetrícia na península de Setúbal, que, segundo disse “tem tido uma “história de sucessivos falhanços”, e avisou que “esta postura de querer fazer as coisas à força, obrigando, sem dialogar, sem falar, sem explicar os objetivos, sem explicar como é que as coisas vão ser feitas, sem ouvir também outras opções, outras possíveis soluções, pode levar a mais um falhanço”.

O bastonário lembrou que já houve tentativas em todo o país de obrigar médicos a deslocarem-se para outros locais, “contra aquilo que é a razoabilidade técnica, a evidência técnica”, o que acabou com a saída dos médicos como aconteceu no Hospital Santa Maria, em Lisboa, de onde saíram sete obstetras.

“Temos esta experiência em Portugal, por isso é que eu acho este anúncio lamentável. É de alguém que não conhece a realidade de Portugal”, vincou.

“Tudo aquilo que é feito à força, posso-lhe garantir, não vai correr bem e nunca terá o apoio da Ordem dos Médicos”, declarou.

Esta forma de transferir equipas já ocorreu no verão de 2023, no Hospital de Santa Maria, aquando do fecho da maternidade para obras e construção da nova unidade. Na altura, Ana Paula Martins estava na administração do Santa Maria.

A mudança forçada de profissionais – para o Hospital São Francisco Xavier – foi justificada com a superior proteção da saúde pública, mas a situação não correu bem e, na altura, sete obstetras decidiram rescindir com o Serviço Nacional de Saúde.

A junção de profissionais na urgência de São Francisco Xavier durou cerca de um mês.

Em declarações ao Expresso, o ex-ministro da ministro da Saúde, Manuel Pizarro, chamou a atenção para as diferenças para com a concentração na margem sul: “Não foi fácil e alguns médicos nunca chegaram a sair do Santa Maria. Mas havia um motivo de força maior, o fecho da maternidade para obras, e por isso a urgência [estava impedida] de continuar a assegurar cuidados. E tinha um caráter temporário.”

Mas já antes, em maio de 2023, o anterior Governo conseguiu a partilha de escalas de urgência em obstetrícia com elementos dos hospitais das Caldas e de Leiria, mas neste caso dispensou qualquer despacho pois a alteração ocorreu de forma voluntária.

Os sindicatos garantem que, à exceção dos médicos em dedicação plena, não vai ser possível obrigar as equipas a mudarem de local de trabalho contra a sua vontade pois “os acordos coletivos protegem os médicos da deslocação do seu local de trabalho”, disse a presidente da FNAM, Joana Bordalo e Sá.

A dirigente sindical explica que a concentração dos cuidados “foi possível entre o Santa Maria e o São Francisco Xavier porque estão no mesmo concelho”.

O secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos, Nuno Rodrigues, não tem dúvidas de que a “mobilização dos médicos terá de ser em regime voluntário”.

Diz que o sindicato apoia a ideia de uma urgência metropolitana, mas com quatro garantias: “A adesão voluntária, a existência de equipas completas e incentivos remuneratórios e não remuneratórios, porque se os médicos vão trabalhar mais também têm de descansar mais.”