Em Valongo, na área metropolitana do Porto, uma casa antiga ganhou nova vida sem precisar de qualquer transmutação – excluindo o facto de estar virada ao contrário. Os arquitectos João Paupério e Maria Rebelo, do atelier Local, depararam-se com uma construção que era “uma folha em branco”, conforme explica o arquitecto. “Existia apenas a estrutura de pedra das paredes da casa e a estrutura de madeira do piso e do telhado. A casa tinha dois pisos completamente vazios.”

O arquitecto conhece bem o cliente que lhe apresentou a proposta: é o irmão, que adquiriu a propriedade sem ter uma ideia concreta acerca do propósito que lhe daria, tendo até considerado vendê-la. Por fim, decidiu torná-la numa habitação própria, e confiou a tarefa a João.

 A casa foi baptizada pela dupla de arquitectos como Valongo VII. Tem uma área de apenas 70 metros quadrados, mas foi redesenhada de modo a proporcionar a sensação de ser espaçosa. A localização da casa foi aquilo que inspirou João Paupério e Maria Rebelo a planear o layout interior de uma forma pouco convencional: esta situa-se na encosta de um vale, e tem duas cotas de jardim na parte de trás do logradouro. “Para tirar maior proveito da vista, e da relação com a cota mais alta do jardim na parte exterior da casa, optámos por inverter a casa, ou seja, ter os espaços mais públicos, a sala e a cozinha, no piso superior, e os quartos em baixo.”

O projecto, que teve uma duração de dois anos (de 2023 a 2025), foi executado com vista a evitar ao máximo a construção ou a extensão, tentando fazer uso das estruturas existentes. “Essa escolha parece-nos mais ou menos inevitável, tanto por questões ecológicas, como por questões económicas”, explica João Paupério. “Além disso, o atelier tem a filosofia de que aquilo que já existe tem valor por já existir, independentemente de possuir valor histórico ou simbólico, e, por isso, merece ser aproveitado.”

A mudança mais relevante ocorreu na parte exterior. O jardim desenvolve-se em duas cotas diferentes, uma no rés-do-chão e outra superior, que era utilizada para o cultivo agrícola. Esta última não possuía acessos directos a partir da casa, pelo que se tornou importante articular os espaços: “Construímos uma espécie de terraço com uma ponte, que permite estabelecer essa relação. Foi a única coisa que adicionámos à casa”, descreve o arquitecto.

A fachada foi forrada a cortiça, e foi adicionada uma parede espelhada que reflecte o jardim projectado, em colaboração com o atelier Pomo. Aliás, em toda a habitação se fez uso de superfícies espelhadas, para fazer com que a casa pareça maior do que é realmente: outro exemplo pode ser observado no andar inferior da casa, onde a porta da casa de banho reflecte os detalhes vermelhos das paredes brancas do hall de entrada.

O projecto base “foi construído conforme foi imaginado”, mas deixaram-se opções em aberto, que foram resolvidas em obra. Por exemplo, no caso do tecto em formato de tenda, os arquitectos aperceberam-se, durante a execução, de que o pladur possuía bastante flexibilidade, e assim surgiu a ideia. 

A casa constrói-se a partir de pequenos detalhes como este. “Diria que uma coisa que faz muita diferença foi o facto de termos integrado a estrutura de madeira existente na casa para dar carácter aos espaços”. 

Assim, com um projecto de execução mínimo e pragmático, os arquitectos transformaram esta residência invulgar numa espécie de “cabana para viver na cidade, pensada como uma casa de férias para viver o ano inteiro”.