Um novo levantamento do projeto Observa Infância, parceria do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fiocruz e da Faculdade de Medicina de Petrópolis (FMP/Unifase), alerta para o avanço da coqueluche entre crianças pequenas no Brasil.
Embora preveníveis com a vacinação, 4.304 casos da doença foram registrados no ano passado em menores de 5 anos, um aumento de 1.253% em relação aos 318 de 2023. Uma década antes, em 2015, foram notificados 4.630 casos, semelhante ao cenário atual.
No ano passado, as taxas de incidência da doença foram mais altas no Paraná (443,9 casos a cada 100 mil crianças), Distrito Federal (247,1) e Santa Catarina (175,9), superiores à taxa média nacional de 95.
Em 2025, a coqueluche segue em alta: até agosto, dados preliminares mostram que já foram notificados 1.148 casos, com concentração em Minas Gerais (229), São Paulo (217) e Rio Grande do Sul (146).
— Estávamos observando esse aumento já em 2023, 2024 e parece que vai continuar em 2025. Os números podem até não ser tão altos quanto 2024, mas estão em um patamar elevado. As coberturas vacinais melhoraram, mas ainda não estão batendo a meta em alguns lugares. Temos muitos bolsões no Brasil ainda de lugares baixas coberturas vacinais, ou seja, muita heterogeneidade na proteção, o que abre brechas para surtos como temos observado — avalia Patricia Boccolini, professora da Unifase, coordenadora Observa Infância.
A coqueluche é uma infecção respiratória causada pela bactéria Bordetella pertussis. Ela é transmitida, principalmente, por meio de gotículas eliminadas pela tosse, por espirro ou mesmo ao falar. Os sintomas demoram, em média, 5 a 10 dias para aparecer e se manifestam com febre baixa, mal-estar geral, coriza e tosse seca.
Segundo o Ministério da Saúde, o quadro gradualmente evolui para crises de tosse mais intensa, que podem inclusive provocar vômitos. Nesses momentos, a criança também pode ter dificuldade para respirar. A ctosse ostuma persistir por duas a seis semanas, mas pode chegar a até três meses.
Casos graves de coqueluche podem levar a quadros de infecções, pneumonia, parada respiratória, convulsões ou mesmo morte. De acordo com o levantamento do Observa Infância, foram registradas 1.330 hospitalizações em 2024, contra 420 em 2023, um aumento de 217%.
No ano passado, as maiores taxas de hospitalização ocorreram no Amapá (158,3 por 100 mil crianças), em Santa Catarina (83,5) e no Espírito Santo (46,0), contra a média de 29,4 registrada em 2024 no Brasil.
10 anos antes, em 2015, eram 4.762 internações anuais por causa da coqueluche, 72% a mais que no ano passado, o que indica uma queda acentuada nos casos graves. Em 2025, os dados preliminares de até agosto mostram que foram notificadas 577 internações.
Em relação às mortes, foram 14 vítimas fatais menores de 4 anos em 2024, contra um acúmulo de apenas 10 casos entre 2019 e 2023.
A vacinação é a principal maneira de se proteger da coqueluche. Ao nascer, a pentavalente previne a doença, assim como difteria, tétano, hepatite B e Haemophilus influenzae B. No Programa Nacional de Imunizações (PNI), está disponível o esquema composto de três doses, indicadas aos dois, quatro e seis meses de idade.
Já a partir de um ano, são indicados dois reforços com a vacina tríplice bacteriana infantil (DTP). O primeiro deve ser administrado aos 15 meses de vida, e o segundo aos 4 anos de idade.
Segundo o Observa Infância, a cobertura com a DTP aumentou em 2024, de 87,6%, no ano anterior, para 90,2%. Ainda assim, não alcançou a meta nacional de 95%. A última vez que a dose atingiu esse percentual foi em 2015, há mais de 10 anos.
Para os pesquisadores, o cenário mostra que, embora haja uma recuperação, permanece uma margem de vulnerabilidade alta capaz de favorecer a circulação da doença, especialmente entre os mais novos.
— Olhando para o mundo, também temos observado aumentos e acreditamos que isso pode estar relacionado a lacunas geradas pela pandemia. Tivemos um impacto forte nas coberturas. Tivemos dois, três anos com coberturas muito baixas, então houve um acúmulo de suscetíveis, ou seja, de crianças que deveriam ter sido vacinadas e não foram, ou foram tardiamente — diz Patrícia.
Para a coordenadora do Observa Infância, é importante fortalecer as campanhas de vacinação e fazer busca ativa e repescagem dos não vacinados, especialmente no segundo ano de vida e pré-escolar, que é a época dos reforços. Ela explica que essas medidas são ainda mais necessárias nos territórios de maior risco, em que há maior número de suscetíveis.
— Muitas vezes quando olhamos para os números nacionais, estaduais, não vemos o que está acontecendo no micro, nos mais de 5 mil municípios que temos no Brasil — diz.