Praticamente um mês depois do acidente no Elevador da Glória, que fez 16 vítimas mortais no passado dia 3 de setembro, a Fidelidade, seguradora da Carris, ainda não conseguiu contactar todas as pessoas que ficaram feridas. Ao Observador, fonte oficial da seguradora revela que, dos 22 feridos identificados no acidente, ainda não foi possível contactar quatro — dois espanhóis, um francês e um de nacionalidade portuguesa. E há ainda dois feridos por identificar.
Logo após o acidente, a Fidelidade recebeu um auto de ocorrência elaborado pelas autoridades que contabilizava um total de 24 feridos, dos quais 22 identificados e dois por identificar. No que toca aos identificados, a seguradora diz estar em contacto “com 18 deles, quer seja diretamente ou com familiares/representantes”. Existem, porém, três pessoas de nacionalidade estrangeira (dois espanhóis e um francês) “para os quais não temos qualquer contacto, pelo que estamos a solicitar a colaboração junto das respetivas embaixadas”. Há também um ferido português com o qual a Fidelidade diz não ter tido “sucesso” no contacto.
Face à gravidade do acidente e à multiplicidade de nacionalidades envolvidas, há, um mês depois, processos em fases diferentes. Relativamente aos feridos estrangeiros, foram feitos os contactos com as embaixadas dos países de origem das vitimas, com a Carris e com a Câmara Municipal de Lisboa, “para apoiar nos procedimentos iniciais”.
Entre os feridos estrangeiros de média ou alta gravidade conta-se uma cidadã marroquina que foi repatriada para Marrocos, “com acompanhamento clínico, assegurado pelo nosso representante local e cobertura das despesas médicas necessárias”, revela fonte da seguradora ao Observador.
Já a família alemã (pai, mãe e filho) envolvida no acidente foi repatriada num avião-hospital, “para acompanhamento clínico na Alemanha”. Segundo a Fidelidade, os custos iniciais foram assumidos pela seguradora de saúde das vítimas, “estando previsto o seu reembolso”. Foi pedida a intervenção e acompanhamento do representante local da Fidelidade, estando este em contacto com representante das vitimas. Esta foi a família em que o pai foi, inicialmente, dado como morto, tendo sido confirmado mais tarde que não corria risco de vida.
No caso de uma cidadã suíça, foi estabelecido um contacto por um familiar diretamente para a Fidelidade, tendo sido encaminhado para o representante local da seguradora para acompanhamento.
Há ainda uma cidadã sul-coreana que continua internada em Portugal, “a aguardar estabilização da sua situação clínica” cujo caso está a ser acompanhado “em articulação com a respetiva embaixada”.
Entre os feridos estrangeiros de baixa ou média gravidade consta uma cidadã italiana que regressou a Itália “tendo a Fidelidade já solicitado a intervenção do seu representante local”. E há ainda três feridos suíços, cujo contacto foi conseguido através da Carris, “tendo sido informados dos contactos do nosso representante local para o acompanhamento”, explica a Fidelidade.
Já entre os feridos de nacionalidade portuguesa que são acompanhados pela Fidelidade enquanto seguradora de acidentes de trabalho, está a ser feito o acompanhamento clínico de três vítimas, estando duas ainda internadas. Neste âmbito, a Fidelidade teve de comunicar ao Tribunal do Trabalho o falecimento do guarda freio.
Existem ainda casos de feridos de nacionalidade portuguesa que estão a ser acompanhados por outras seguradoras. Nestas circunstâncias, em que a regularização dos procedimentos iniciais e das indemnizações está a ser conduzida por seguradoras que não a da Carris, caberá à Fidelidade reembolsar as despesas que forem pagas, se assim for solicitado. “Eventuais danos ou prejuízos não cobertos por acidentes de trabalho serão pagos diretamente pela Fidelidade”, esclarece a seguradora, que também tem estado “a prestar diretamente às vitimas e/ou seus representantes todos os esclarecimentos que sejam solicitados, nomeadamente na explicitação do que está coberto pelo seguro de acidentes de trabalho e do que estará coberto pelo seguro de automóvel”, categoria na qual está inserido o elétrico.
Foi ainda estabelecido o contacto com os feridos ligeiros, “com o objetivo de recolher informações sobre as lesões e necessidades mais urgentes”, para a possível prestação do apoio devido e “o pagamento dos danos que tiverem decorrido da ocorrência”.
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Na resposta às questões do Observador, a Fidelidade adianta ainda que já foram pagos os valores relativos às transladações, funerais, alojamentos e viagens de familiares de seis vítimas mortais, nomeadamente as de nacionalidade ucraniana, marroquina, norte-americana e as três inglesas. Isto em colaboração com as agências funerárias e após contacto com as respetivas embaixadas, com a Carris e com a Câmara de Lisboa.
As outras vítimas mortais estrangeiras (dois residentes no Canadá, um suíço e dois sul-coreanos) tiveram os seus procedimentos tratados diretamente pelas famílias, “ainda antes de termos a identificação das vitimas”, diz a Fidelidade, que garante ter-se disponibilizado “para assumir os custos associados, tendo disponibilizado um contacto telefónico direto e um endereço de email para envio de despesas e pedidos de esclarecimento, bem como providenciado representantes locais nos países de origem das vítimas onde temos representantes”.
A seguradora diz ter feito reuniões presenciais com embaixadas ou familiares/representantes das vítimas sempre que foi solicitado.
O acidente fez ainda quatro mortos de nacionalidade portuguesa, todos trabalhadores da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Nestes casos, “a regularização dos procedimentos iniciais e das indemnizações está a ser conduzida pelas seguradoras de acidentes de trabalho, às quais a Fidelidade efetuará, assim for solicitado, o reembolso das despesas por estas efetuadas”, sendo que “eventuais danos ou prejuízos não cobertos por acidentes de trabalho serão pagos diretamente pela Fidelidade”.
Neste momento, e para a generalidade das situações, aguarda-se o envio de documentos, imprescindíveis para que as indemnizações possam ser apuradas e pagas. Essa documentação ainda não chegou e não há data prevista para a conclusão destes processos. A Fidelidade anunciou, em meados de setembro, a criação de uma comissão técnica independente composta por peritos em medicina, direito e psicologia, e que vai validar e fazer recomendações sobre as indemnizações a pagar às vítimas. A proposta do valor a pagar a cada familiar ou vítima é fixada pela Fidelidade, que a submete à comissão independente para esta emitir o seu parecer. Mas a decisão final “cabe sempre à seguradora”, e pode ou não ser aceite pelos lesados. Nos casos em que isso não acontece, parte-se para tribunal.
“O valor das indemnizações é determinado caso a caso, de acordo com os critérios definidos na lei portuguesa e com critérios técnico-atuariais que consideram fatores como idade, rendimentos, dependentes, despesas ou danos não patrimoniais”, explica a Fidelidade.
Relatório aponta possível causa do acidente: cabo do elevador cedeu no ponto de fixação
Até ao próximo dia 19 de outubro, terá de ser divulgado pelo Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários (GPIAAF) um relatório mais detalhado sobre o acidente. Mas as conclusões do mesmo não terão impacto nas indemnizações a apurar. “As auditorias servirão para apurar as causas do acidente e clarificar eventuais responsabilidades adicionais, mas não é expetável que alterem a obrigação de indemnizar terceiros lesados”, esclarece a seguradora. “A Fidelidade já está a trabalhar nos processos de indemnização e irá prosseguir com pagamentos nos termos da lei e do contrato de seguro existente, à luz dos factos conhecidos até ao momento”.
A seguradora refere que logo a 4 de setembro “assumiu publicamente a responsabilidade, comunicando, de imediato, o seu compromisso em apoiar vítimas e famílias com a máxima celeridade e transparência, ainda que isso implicasse estar a fazê-lo sem que os factos estivessem, ainda, finalmente apurados na íntegra”.
Cabe também à Fidelidade, enquanto seguradora da Carris, fazer uma peritagem ao imóvel da Calçada da Glória onde o ascensor embateu. E esse processo já ocorreu, adianta a seguradora ao Observador, “aguardando-se diligencias complementares para se mandar proceder à sua reparação”.
A seguradora ainda está à espera que lhe seja disponibilizado pelas autoridades “o acesso aos ascensores de forma a poder efetuar a sua peritagem, bem como o enquadramento dos danos apurados nos seguros próprios” da Carris.