As narrativas de sobrevivência em ambientes hostis são fascinantes, porque revelam até onde pode ir a resistência humana. Entre a fome, o medo e a solidão, os sobreviventes descobrem que a maior batalha não é com a Natureza, mas com os limites do próprio corpo e da mente.

De «Lost» [Perdidos] a adaptações como «And Then There Were None», de Agatha Christie, a televisão já mostrou como o isolamento extremo e o perigo iminente amplificam os dilemas humanos. «Nine Bodies», em estreia no canal AXN Portugal, parte exactamente desse ponto: um grupo de viajantes cai na selva sem comunicações nem saída; e, à medida que o grupo diminui, torna-se claro que escapar à queda foi apenas o início do verdadeiro pesadelo.

Criada por Anthony Horowitz [autor dos livros de Alex Rider, que inspiraram a série com emissão no canal AXN Portugal], «Nine Bodies» é uma minissérie de seis episódios que combina a tensão de um thriller policial com a brutalidade de uma história de sobrevivência. Protagonizada por Eric McCormack [Will & Grace, Perception], no papel do enigmático Kevin Anderson, a produção reúne ainda um elenco internacional com rostos familiares, de David Ajala (Star Trek: Discovery) a Siobhán McSweeney (Derry Girls). Entre flashbacks que revelam segredos escondidos e alianças frágeis que se desmoronam a cada instante, a narrativa mantém um ritmo implacável: um grupo fechado, um assassino à solta e a sensação constante de que todos os caminhos conduzem ao mesmo destino.

Acidentes de avião que desafiaram a condição humana

Os acidentes aéreos que terminam em sobrevivência extrema não ficam apenas registados em relatórios ou estatísticas: ficam gravados na memória colectiva, porque expõem, de forma brutal, a fragilidade e, ao mesmo tempo, a força do ser humano. São histórias em que cada minuto conta, cada gesto pode ser decisivo e onde a esperança resiste quando tudo parece perdido.

Na selva amazónica, em 1971, essa linha foi percorrida por Juliane Koepcke. Aos 17 anos, sobreviveu sozinha a uma queda de cerca de três mil metros, depois de o avião em que seguia com a mãe se ter despenhado durante uma tempestade. Ferida, desorientada e em choque, avançou pela floresta com uma determinação instintiva. Durante 11 dias caminhou seguindo os cursos de água, guiada pelo som do rio e pela esperança de encontrar alguém. Quando finalmente foi descoberta por madeireiros junto a um rio, a jovem tinha transformado o isolamento absoluto e a selva – simultaneamente ameaça e refúgio – na chave da sua sobrevivência.

Menos de um ano depois, nos Andes, outro episódio entrou para a história. A 13 de Outubro de 1972, o Voo 571 da Força Aérea Uruguaia caiu a mais de 3.500 metros de altitude, deixando 45 pessoas isoladas em plena cordilheira. Durante mais de dois meses resistiram ao frio extremo e à fome até serem finalmente resgatados. As decisões dramáticas que tiveram de tomar tornaram-se símbolo de resistência – e lembram-nos de como, em situações-limite, a fronteira entre a ética e a sobrevivência pode ser dolorosamente ténue.

Em 2009, Nova Iorque mostrou outra face da sobrevivência. O Voo 1549 da US Airways, conhecido pelo “Milagre no Hudson”, fez uma amaragem de emergência no rio minutos depois da descolagem, quando as duas turbinas falharam após colisão com aves. Graças à perícia da tripulação, todos os 155 ocupantes sobreviveram. O episódio tornou-se exemplo de sangue-frio e de como a cooperação em momentos críticos pode transformar uma catástrofe quase certa numa história de resiliência colectiva.

Nem todos os acidentes dão lugar a histórias de resistência. Alguns marcam-nos precisamente pela violência com que eliminaram qualquer hipótese de salvação. Em 2016, a queda do avião que transportava a equipa da equipa de futebol Chapecoense, da primeira divisão brasileira, deixou apenas seis sobreviventes entre as 77 pessoas a bordo.

Casos assim mostram que, apesar de toda a tecnologia, a aviação moderna não está livre de acontecimentos imprevisíveis. A 7 de Agosto de 2020, em Kerala, na Índia, o Voo Air India Express 1344 ultrapassou a pista durante uma aterragem sob forte chuva e despenhou-se por uma ravina, revelando como a fronteira entre a vida e a morte pode depender de detalhes. E há ainda casos como o do Voo MH370 da Malaysia Airlines, em 2014, cujo desaparecimento absoluto – com destroços identificados anos depois, mas sem localização do aparelho e sem conclusão definitiva – deixou famílias suspensas na incerteza.





«Nine Bodies»: a série que transforma a sobrevivência em thriller psicológico

O que distingue «Nine Bodies» não é a recriação de um desastre aéreo, mas a forma como leva para a ficção as perguntas que sempre acompanharam as histórias reais: quem somos quando tudo nos é retirado, o que fazemos quando já não há regras, em quem confiar quando cada gesto pode ser decisivo.

Não se trata de um reflexo literal dos acidentes que marcaram a memória colectiva, mas um prolongamento das suas interrogações. Mostra que sobreviver não significa chegar intacto, mas atravessar um desafio que corrói tanto quanto fortalece.

Em «Nine Bodies», ninguém está seguro, ninguém está livre de suspeita. É essa incerteza que prende o espectador até ao último minuto. A minissérie pode ser vista no canal AXN Portugal, às quartas-feiras, pelas 22h.