Astrónomos identificaram um planeta errante que consome gás e poeiras do meio que o rodeia a uma taxa de seis mil milhões de toneladas por segundo, divulgou esta quinta-feira o Observatório Europeu do Sul (ESO, na sigla em inglês). É considerada a taxa de crescimento “mais elevada alguma vez registada” em qualquer planeta.
Publicada esta quinta-feira na revista The Astrophysical Journal Letters, a descoberta foi levada a cabo com o auxílio do espectrógrafo X-shooter montado no Very Large Telescope (VLT), que o ESO tem no deserto chileno do Atacama. Também foram utilizados dados do telescópio espacial James Webb, operado pelas agências espaciais dos Estados Unidos, da Europa e do Canadá, assim como dados de arquivo do espectrógrafo Sinfoni do VLT.
Os planetas errantes, ao contrário dos do nosso sistema solar, não orbitam estrelas, “flutuando livremente por si mesmos”. “Temos tendência a pensar nos planetas como mundos tranquilos e estáveis, mas esta descoberta mostra-nos que objectos de massa planetária que flutuam livremente no espaço interestelar podem ser lugares muito entusiasmantes”, referiu o autor principal deste estudo, Víctor Almendros-Abad, que integra uma equipa de astrónomos constituída por dez cientistas, incluindo Koraljka Muzic, do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
Víctor Almendros-Abad, do Observatório Astronómico de Palermo, do Instituto Nacional de Astrofísica (em Itália), realçou que o processo de atracção de material (acreção) é o “mais intenso alguma vez registado para um objecto de massa planetária”.
Em Agosto, o planeta estava a acumular massa cerca de oito vezes mais depressa do que apenas alguns meses antes. No entanto, a equipa de Víctor Almendros-Abad descobriu que a taxa de acreção deste jovem planeta não é constante. Tendo uma massa cinco a dez vezes superior à de Júpiter, o planeta situa-se a cerca de 620 anos-luz de distância da Terra, na constelação do Camaleão. Ainda se encontra em formação, estando a ser alimentado por um disco de gases e poeiras que o circunda. O seu nome oficial é Cha 1107-7626.
Linha esbatida entre estrelas e planetas
O astrónomo Aleks Scholz, co-autor do estudo da Universidade de St. Andrews (Reino Unido), questionou-se se os planetas errantes “terão uma formação semelhante à das estrelas, mas com massas muito pequenas, ou se serão planetas gigantes ejectados dos seus sistemas de origem”. Os resultados indicam que alguns planetas errantes parecem partilhar um processo de formação semelhante ao das estrelas, uma vez que enormes taxas de acreção repentinas semelhantes a esta foram já observadas em estrelas jovens.
“Esta descoberta esbate a linha entre estrelas e planetas e aproxima-nos mais das primeiras fases de formação dos planetas errantes”, acrescentou a co-autora do estudo Belinda Damian, também astrónoma da Universidade de St. Andrews.
Ao comparar a luz emitida antes e durante o aumento enorme da taxa de acreção, os astrónomos reuniram pistas sobre a natureza do processo. A actividade magnética terá desempenhado “um papel importante na taxa enorme de acreção da matéria, algo que só havia sido anteriormente observado em estrelas, sugerindo que mesmo objectos de pequena massa podem ter campos magnéticos fortes, capazes de alimentar tais eventos de acreção”.
A equipa de cientistas descobriu ainda que a química do disco em torno do planeta mudou durante o fenómeno de acreção, com vapor de água a ser detectado durante o evento, mas não antes. Este fenómeno já tinha sido observado anteriormente em estrelas, mas nunca em nenhum tipo de planeta. “A ideia de que um objecto planetário se pode comportar como uma estrela é muito interessante e leva-nos a imaginar como é que mundos diferentes do nosso seriam durante os seus estágios iniciais”, acrescentou Amelia Baio, também co-autora do estudo e astrónoma do ESO.