Foi à margem do Fórum do Futuro da Tributação, organizado pelo Fórum de Integração Brasil Europa (FIBE), que Andrei Passos Rodrigues falou com a CNN Portugal sobre cooperação e crime organizado. O diretor-geral da Polícia Federal do Brasil acredita que, embora haja alguns motivos de preocupação, “não é necessário todo o alarde feito pelos media” sobre o Primeiro Comando da Capital (PPC)

Não queremos dar publicidade a esse tipo de organizações, mas é preciso ou não que Portugal tenha uma lei do tipo antimáfia como existe em Itália?
Eu não acredito. Primeiro, eu não conheço muito bem a realidade portuguesa, pese a nossa cooperação entre os nossos países e entre a Polícia Federal (brasileira) com a polícia portuguesa. Agora, entendo que cada país tem a sua forma de governança na luta contra o crime. E Portugal tem índices muito positivos na luta contra a criminalidade. Eu entendo a realidade brasileira e penso que tentar classificar uma organização facciosa como uma máfia é um equívoco, é trazer um status a um grupo criminoso que não tem essas características. E nenhum lugar do mundo, fora Itália, tem uma legislação para esse tipo de crime. Não existe em Portugal, não existe em Espanha, não existe na Alemanha, em França, na Suíça, nos Estados Unidos nem no Canadá. E eu entendo que não precisamos, porque todos os países já têm legislação contra o crime organizado. E essas sim, precisam de ser permanentemente atualizadas para acompanhar os factos que vamos encontrando. 

O senhor já disse que não havia lugar para preocupação quanto à presença do PPC, mas também lemos que é preciso mais cooperação entre Portugal e Brasil na luta contra o crime organizado. O que mudou?
Eu acho que, primeiro, eu sou um defensor da cooperação. Acho que deve haver sempre mais cooperação e mais troca de informação. Mas eu não vejo motivo para o alarde que está sendo feito. Nós temos um trabalho muito próximo de cooperação com as polícias portuguesas. E eu estive esta semana reunido aqui com três comandantes da Polícia de Segurança Pública, da Polícia Judiciária e da Guarda Nacional Republicana. Tratámos de questões de interesse para os nossos países e de cooperação. Então, o que eu diria é que é preciso parar com essa neurose de que é tudo culpa de determinada organização criminosa, quando não é.

Mas acha que há uma especulação mediática?
Eu tenho a certeza de que há uma especulação mediática, proposta por muitos atores políticos, por pessoas que, muitas vezes, buscam uma promoção pessoal e que não têm uma relação concreta com a área. Já me disseram que há um clube de futebol que pertence a determinada organização criminosa e que tem 40 mil membros. E eu pergunto: onde está esse clube de futebol? Onde estão essas 40 mil pessoas? E onde está essa lavagem de dinheiro? 

Ainda assim, o senhor sabe que essa preocupação existe em Portugal, a da entrada ou da circulação destes elementos do crime organizado, como do PPC. Que fatores podem estar a facilitar a entrada destes elementos?
Veja, a relação Brasil-Portugal… não preciso de o dizer, de falar da História que temos. E eu tenho uma preocupação muito forte com isso. Acho que é o tema de não misturar a questão migratória com a questão criminal. Muitas pessoas, às vezes, utilizam o tema do crime organizado. E aí, talvez,  exista uma pauta subliminar para adotar algumas políticas públicas usando o que, na minha avaliação, é um argumento que não pode ser validado na íntegra, ou seja, o argumento de que aumenta a migração e aumenta o crime.

Teme que esta perceção desta presença de um grupo criminoso transnacional possa afetar a relação entre Brasil e Portugal? Parece-lhe um exagero?
Eu não acredito que vá afetar as relações porque as relações são muito honestas, sinceras e diretas. E, repito…

Mas eu falo-lhe do brasileiro médio que vem trabalhar, pagar segurança social, que é o que faz a grande maioria, não da relação entre instituições e Estados…
Nós temos uma relação de amigos. Mas o tipo de avaliação [de que o crime aumenta quando aumenta a migração] não se relaciona com a realidade, muitas vezes. Então, se é algo dissociado da realidade, basta as pessoas com sensatez sentarem-se à mesa, confrontarem os números e verificarem que, de fato, isso não é realidade. Infelizmente, há brasileiros que cometem crimes em Portugal, imagino eu que de outras nacionalidades também. Pelo volume de brasileiros que está em Portugal, talvez haja alguma quantidade de crimes, mas isso não é representativo da população. Estima-se, formalmente, que haja uns 500 mil, talvez sejam quase um milhão de brasileiros aqui em Portugal. Então, eu digo que essa é uma análise [a de que o crime aumenta com a migração] que não se sustenta com a realidade e por isso é que não vai haver um abalo nas relações.