Doenças dermatológicas com acne, dermatite, psoríase são condições conhecidas e, geralmente, mexem com a autoestima. Há outras condições que já não possuem a mesma popularidade, o que dificulta quem possui de entender o que é, como no caso da hidradenite supurativa (HS).

De acordo com o Ministério da Saúde, trata-se de uma doença inflamatória crônica e recorrente que afeta os folículos pilosos, principalmente em áreas com muitos folículos pilosos como axilas e virilha, levando à formação de lesões na pele.

Os dados estimam que 0,41% da população brasileira tenha hidradenite supurativa. É uma condição que pode surgir por vários motivos, como predisposição genética, desequilíbrios hormonais, pressão alta, colesterol alterado e inflamação excessiva no corpo.

Além de fatores externos, como obesidade, cigarro, diabetes, roupas apertadas que causam atrito e o uso de alguns remédios, como lítio, pílulas anticoncepcionais e isotretinoína (medicamento usado principalmente para tratar a acne grave) também agravam a doença.

A comunicóloga e criadora de conteúdo digital Jessica Tauane, 34, convive com hidradenite supurativa e usa suas redes sociais para informar e conscientizar sobre a doença, já que não é um tema tão abordado. Ela teve um diagnóstico precoce aos 17 anos, por histórico familiar. “Minha avó e minha mãe já haviam recebido o diagnóstico.”

“Na pele, a gente já sente muita coisa, né? Por mais que seja algo que dê para esconder, você vai ter momentos íntimos em que isso aparece, não tem como evitar. Eu já sou uma mulher fora do padrão: sou lésbica, sou uma mulher gorda… Então já tive que lidar com muitas questões de autoaceitação”, completa Jessica.

O dermatologista João Vitor Perez, do Hospital São Luiz Morumbi, da Rede D’Or, explica que essa é uma doença “sem cura definitiva conhecida, por isso é essencial o diagnóstico precoce e correto, além do acompanhamento com dermatologista para controle das lesões”. Importante ressaltar que a HS não é contagiosa e nem está relacionada a infecções ou falta de higiene.

A HS pode se assemelhar a outras condições como furúnculos e infecções fúngicas, mas o que a diferencia é a duração, recorrência e distribuição anatômica das lesões. “Furúnculos geralmente são isolados, agudos e não recorrentes nas mesmas áreas, enquanto a HS apresenta múltiplas lesões crônicas e recorrentes” em áreas que criam atritos, como dobras do corpo”, esclarece o dermatologista.

“Já infecções fúngicas raramente formam nódulos profundos, abscessos ou túneis, e têm morfologia clínica distinta”, completa.

Como é feito o diagnóstico

O dermatologista João Vitor Perez afirma que o diagnóstico é baseado em três critérios principais: “a presença de lesões típicas como nódulos inflamatórios dolorosos, abscessos, túneis e tratos sinusais [aberturas que se estendem de uma ferida sob a pele] e cicatrizes; localização em áreas como axilas, região inguinal, perianal, inframamária, glútea ou genital, e curso crônico e/ou recorrente, geralmente definido por pelo menos dois episódios em seis meses ou lesões persistentes por mais de três meses”.

A gravidade da doença “é classificada principalmente pelo sistema de Hurley: estágio I, com lesões isoladas sem túnels; estágio II, com lesões recorrentes com túnels e cicatrizes, mas com áreas de pele normal entre elas, e estágio III, com envolvimento difuso com múltiplos túnels interconectados e cicatrização extensa”, detalha o médico.

Não há exames laboratoriais ou de imagem específicos para confirmar o diagnóstico, sendo a avaliação essencialmente clínica, completa o profissional. Essa é, inclusive, uma das queixas de Jessica Tauane. “O problema é que faltam médicos especializados. Muitos dermatologistas focam a estética da pele e não conhecem a HS. Além disso, planos de saúde barram tratamentos mais caros, como imunobiológicos, exigindo judicialização.”

Quais são os tratamentos disponíveis

O dermatologista explica que o tratamento da hidradenite supurativa varia conforme a gravidade, mas mudanças no estilo de vida são importantes para todos os casos. Nos casos mais leves, pomadas com antibióticos costumam funcionar bem. Quando a doença é moderada, o médico pode receitar antibióticos em comprimido. Nos casos graves, existem medicamentos mais potentes, como os imunobiológicos, que agem diretamente na inflamação do organismo.

Quando a doença está muito avançada, com feridas profundas ou muitas cicatrizes, pode ser necessário fazer cirurgia para remover as lesões. “A cirurgia pode proporcionar controle duradouro, mas envolve riscos de infecção, abertura dos pontos e a possibilidade de a doença voltar no mesmo local.”

Impacto emocional da hidradenite supurativa

Jessica Tauane conhece pacientes com 40 e 50 anos que só descobriram a doença recentemente. “É uma condição que causa sofrimento físico e emocional enorme, e muitas pessoas ainda enfrentam essa jornada sem respostas.”

A criadora de conteúdo relata como a doença afeta a vida social: “Converso com muitas meninas que têm vergonha de ir à praia, por exemplo. É difícil. Mas, com o tempo, fui ressignificando tudo isso.” Hoje, Jessica tem perspectiva diferente sobre essa condição.

“Eu acho que a gente tem mais facilidade de ver beleza na imperfeição dos outros do que na nossa”, reflete. “Descobri que a palavra ‘perfeito’ vem do latim perfectus, que significa ‘completo’. Então, perfeição, na verdade, tem mais a ver com completude do que com essa ideia abstrata e inalcançável que a gente tem.”

Para ela, essa completude pode ser encontrada nas relações humanas. “Se você se sente completo com boas amizades, uma rede de apoio, uma família legal, você já é perfeito do jeito que é.”

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