Uma metanálise publicada na revista Psychooncology concluiu que até 75% das mulheres com câncer de mama experimentam uma névoa cerebral durante o tratamento. A pesquisa analisou nove estudos sobre o “chemobrain”, condição cognitiva advinda da quimioterapia que causa lentidão de pensamento, perda na atenção e na memória.
Essa não é uma questão exclusiva do tratamento para o câncer de mama, mas pode afetar pacientes que realizam quimioterapia para diferentes tipos de câncer. Segundo Luiz Gustavo Torres, oncologista especialista em câncer de mama da Oncologia D’Or, um dos principais sintomas é a sensação de lentificação de compreensão e articulação das ideias.
Os prejuízos são normalmente sutis e leves, como a dificuldade de manter o foco por longos períodos de tempo, dificuldade de planejar, organizar e tomar decisões, iniciar paradas, gerenciar o tempo, e memória, exemplifica Solange Sanches, vice-líder do centro de referência em tumores da mama do A.C.Camargo Cancer Center.
“É muito comum em mulheres que tinham uma habilidade de ser multitarefas, que elas não consigam mais fazer três coisas ao mesmo tempo e ter que fazer uma por vez”, diz a médica.
O quadro que traz prejuízos leves normalmente não precisa de intervenção, afirma Torres. A principal conduta nesses casos, diz, é tranquilizar a paciente de que é um efeito transitório, ou seja, desaparece com o fim do tratamento.
Segundo o oncologista, muitas mulheres se culpam de não estarem conseguindo mais realizar todas as tarefas da forma como faziam antes, seja no trabalho ou em casa. “É importante reconhecer para tranquilizar essa paciente que aquilo é passageiro e que não é nada relacionado nem à parte emocional ou outra doença, mas sim um efeito colateral do tratamento.”
Sanches concorda que, na maioria das vezes, os sintomas somem entre seis meses a um ano. Em torno de 20% dos pacientes, segundo ela, relatam que os sintomas persistem por mais tempo, mas são geralmente os que têm outros fatores de risco, como idade avançada, menor escolaridade ou menor ocupação intelectual, quadros psiquiátricos como depressão, ansiedade e insônia. No entanto, se detectado precocemente, é possível oferecer suporte para aumentar o bem-estar do paciente.
Torres reforça que o “chemobrain” não tem nenhuma relação direta com Alzheimer ou outras demências, que são doenças degenerativas e progressivas. Uma questão que pode acontecer é o paciente, principalmente os idosos, já terem um grau inicial de demência no início do tratamento pode se confundir com os sintomas da névoa cerebral causada pelo tratamento.
Para saber diferenciar um caso do outro, o médico recomenda se atentar para a mudança na facilidade com que a pessoa fazia tarefas rotineiras. “Por exemplo, ir ao banco, pagar as contas, lidar com finanças no geral, entre outras coisas.”
Por isso que, para ele, continuar com a mesma rotina que tinha antes do tratamento, realizando as mesmas tarefas, é uma forma não só de identificar possíveis mudanças, mas de exercitar as funções cognitivas.
“É importante identificar se essa paciente antes da quimioterapia tem algum prejuízo cognitivo, se ela tem algum quadro inicial que possa ter passado despercebido”, diz. “Nesses casos é importante consultar um neurologista ou um geriatra.”
O envolvimento de uma equipe multiprofissional, com avaliação de um neuropsicólogo e a realização de exercícios cognitivos, também com um terapeuta ocupacional pode auxiliar a minimizar o impacto, afirma Sanches.
Cuide-se
Estratégias simples como ler mais, praticar atividade física como caminhadas, ioga e pilates, escrever, fazer exercícios como palavras cruzadas e sudoku e manter contato social são outras possibilidades trazidas pela médica. “Psicoterapia e suporte emocional são muito importantes, porque quadros de ansiedade e depressão podem agravar o ‘chemobrain’.”
A metanálise revelou que os efeitos do treinamento cognitivo, estruturado para melhorar as funções como memória, atenção e velocidade de processamento, tem um efeito pequeno, mas significativo para melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
Além de ter mostrado uma melhora na memória de trabalho, prospectiva, funções executivas e velocidade de processamento, os estudos analisados relataram uma melhora subjetiva no estresse, humor e bem-estar emocional.
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