Vivemos num tempo em que a tecnologia promete tornar tudo mais fácil, rápido e eficiente. Temos aplicações para organizar o dia, ferramentas de inteligência artificial para escrever emails, e instrumentos de automação para responder a mensagens, planear projectos e organizar a nossa vida. A palavra mágica é “eficiência”. A produtividade nunca esteve tão ao nosso alcance; pelo menos, essa é a promessa. Mas há um problema silencioso a crescer por trás desta ideia de eficiência constante: quanto mais fazemos, mais se espera que façamos. É a chamada armadilha da eficiência tecnológica.
A lógica parece simples: se uma ferramenta nos permite fazer em meia hora aquilo que antes levava duas, então ficamos com mais tempo livre, certo? Errado. O que acontece, na prática, é que esse tempo “ganho” é rapidamente preenchido com mais tarefas, mais expectativas e mais pressão para continuar a produzir. Raramente é dedicado a actividades ligadas ao lazer ou repouso. Isto faz com que a tecnologia, em vez de nos libertar, nos empurre para uma espécie de “corrida infinita”. Esta corrida pode conduzir a frustração, a uma sensação de que nunca estamos a fazer o suficiente, mesmo quando estamos constantemente ocupados e, no pior dos cenários, a burnout. A pergunta que se impõe é simples: corremos para onde, mesmo?
O nosso cérebro, essa máquina complexa de lógica, emoções e memórias, não está preparado para esta produtividade contínua. À semelhança de outros estímulos, sempre que completamos uma tarefa — por mais pequena que seja — há libertação de dopamina, o neurotransmissor associado à motivação e prazer. Esta “recompensa instantânea” dá-nos uma sensação momentânea de realização e sucesso. No entanto, como qualquer outro circuito que é constantemente estimulado, torna-se viciante. Queremos repetir. Queremos mais.
O problema? O cérebro não distingue automaticamente entre uma tarefa relevante e uma irrelevante (este é um exercício activo de planificação) e, portanto, trata tudo como “check, check, check”. Riscar coisas da lista torna-se, assim, uma espécie de droga leve da vida moderna. Passamos o dia em busca de mini-vitórias: a responder a e-mails, a agendar reuniões e a tratar de “coisas rápidas”, enquanto deixamos para depois (ou para nunca) o que realmente exige foco, pensamento profundo e concentração.
Esta urgência do presente e hiperprodutividade, alimentada por apps e alertas constantes, tem um custo significativo nos nossos cérebros. Pode levar a uma diminuição da memória de trabalho e do controlo cognitivo (ou seja, a capacidade de organizar os pensamentos e controlar as emoções e comportamentos), uma maior dificuldade em filtrar informações irrelevantes e falta de atenção generalizada, o que pode conduzir a um aumento da fadiga mental e do stress. E estas consequências refletem-se não só a nível individual como institucional e social.
A tecnologia, concebida com o intuito de reduzir a carga cognitiva, está a criar novas formas de tensão mental, a fomentar práticas de disponibilidade constante e, paradoxalmente, a reduzir a capacidade de decisão e autonomia humanas. Está a gerar uma espécie de stress digital omnipresente que, gradualmente, esbate a linha, já ténue, entre produtividade e tempo de repouso.
Ou seja, esta promessa de que seremos mais produtivos graças à tecnologia é, na melhor das hipóteses, ingénua. Na pior, uma armadilha bem montada. Para quê responder a mais emails? Para quê termos reuniões mais curtas que nos deixam com tempo para mais reuniões? Não será que estamos a sacrificar tempo de qualidade, pensamento crítico, e até saúde mental, em nome de uma produtividade utópica que nunca se completa?
Em neurociência, já se sabe que a resolução de problemas complexos e a criatividade precisam de tempo de inactividade, ou seja, de ócio produtivo, de momentos em que o cérebro descansa e vagueia. É nesses intervalos de “preguiça” e “procrastinação” que muitas das melhores ideias surgem. Por isso, como é que mudamos esta tendência?
Talvez o segredo esteja em usar a tecnologia não para acelerar a vida, mas para abrandar onde for possível. Contrariar o velho ditado “Não deixes para amanhã o que podes fazer hoje”! E isso implica reaprender a parar, a priorizar e, se necessário, recalibrar a bússola interna de forma a enganar o algoritmo que guia esta aparente busca pela eficiência.