A viver nos Estados Unidos desde fevereiro, Eduardo Bolsonaro, o terceiro filho do antigo Presidente, trocou, ao longo dos últimos meses dezenas de mensagens com o pai, que incluíram críticas acesas, avisos sobre como lidar com Donald Trump e planos sobre o futuro político de Jair Bolsonaro. As mensagens que tinham sido apagadas e entretanto foram recuperadas pelas autoridades brasileiras no telemóvel apreendido ao ex-chefe de Estado, constam do relatório final da Polícia Federal (PF), publicado na passada sexta-feira, e foram tornadas públicas esta quarta-feira.

A PF indiciou os Bolsonaro de tentarem obstruir o processo em curso, em que Jair Bolsonaro é acusado de tentativa de golpe de Estado, de tentarem atingir diretamente as instituições brasileiras, através da interferência do governo norte-americano, e ainda de “tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito”, pode ler-se no relatório enviado ao Supremo Tribunal Federal, citado pela imprensa brasileira.

O relatório inclui uma série de mensagens recuperadas do telefone de Jair Bolsonaro pelas autoridades que revelam que, aponta a PF, “[os investigados] atuaram de forma coordenada, em unidade de desígnios, para concretização de sanções por governo estrangeiro contra o Estado Brasileiro”. Numa das conversas, Eduardo Bolsonaro revela preocupação com uma possível mudança na posição da Casa Branca.

Você não vai ter tempo de reverter se o cara daqui virar as costas para você. Aqui é tudo muito melindroso, qualquer coisinha afeta. Na situação de hoje, você nem precisa se preocupar com cadeia, você não será preso. Mas tenho receio que, por aqui, as coisas mudem. Mesmo dentro da Casa Branca tem gente falando para o 01: ‘ok, Brasil já foi. Vamos para a próxima’.

Para ultrapassar esse problema, o deputado sugere ao pai que publique nas redes sociais uma mensagem de agradecimento a Donald Trump, de forma a manter a atenção do líder norte-americano, sugestão que recebeu a concordância de Jair Bolsonaro, descreve a PF no relatório citado pelo G1.

Eu quero postergar este bom momento de agora, mas se o nosso cara vai encontrar o 01 sem nenhum tweet seu, te adianto que isto não será bem recebido.

Noutra ocasião, as mensagens tiveram um tom bem menos conciliador. Em entrevista ao portal Poder360, no dia 15 de julho, Bolsonaro foi questionado sobre a discussão entre o terceiro filho e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e respondeu que o filho não é “tão maduro”. Dois dias depois, recebeu uma série de mensagens acesas no Whatsapp.

Eu ia deixar de lado a história do Tarcísio, mas graça aos elogios que vc fez a mim no Poder 360 estou pensando seriamente em dar mais uma porrada nele, para ver se vc aprender. VTNC [Vai Tomar no C*] SEU INGRATO DO C*****!

Nos minutos seguintes, Eduardo Bolsonaro enviou outras três mensagens, em que acusava o pai de estar a trabalhar contra ele, ao tomar o lado de Tarcísio de Freitas.

Se o IMATURO do seu filho de 40 anos não puder encontrar com os caras aqui, PORQUE VC ME JOGA PRA BAIXO, quem vai se f**** é vc. E VAI DECRETAR O RESTO DA MINHA VIDA NESTA PORRA AQUI. TENHA RESPONSABILIDADE!

A PF interpreta as mensagens como uma tentativa de Eduardo Bolsonaro de alavancar as pretensões presidenciais do pai junto do governo de Washington. “[Eduardo Bolsonaro] vem atuando no exterior com nítido propósito de inviabilizar, perante interlocutores estrangeiros, possíveis pré-candidatos à Presidência da República vinculados ao espectro político mais à direita do cenário nacional”, consideram as autoridades.

Depois da tirada incendiada, Eduardo Bolsonaro enviou novas mensagens no dia seguinte, em que admitiu ter ficado irritado e ter exagerado nas palavras e pediu desculpa ao pai.

Esta quarta-feira, o deputado criticou a publicação das mensagens e acusou, novamente, as autoridades brasileiras de não procurarem a “justiça”, mas o “desgaste político”. “É lamentável e vergonhoso ver a Polícia Federal tratar como crime o vazamento de conversas privadas, absolutamente normais, entre pai e filho e seus aliados”, acrescentou Eduardo Bolsonaro.

No telemóvel apreendido, as autoridades encontraram ainda documentos sobre um pedido de asilo político na Argentina, que o Supremo Tribunal Federal considerou como prova da “existência de risco de fuga”. Devido a este risco e ao incumprimento das medidas de coação, Jair Bolsonaro encontra-se em prisão domiciliária, enquanto aguarda o início do julgamento por tentativa de golpe de Estado que irá começar no próximo dia 2 de setembro.