Já deste por ti a pensar se a hora a que fazes um exame na faculdade tem impacto na nota final? Talvez o resultado ao início da manhã, quando estás com sono, seja diferente daquele quando já estás mais desperto. Agora, há um estudo que nos ajuda a responder a isto. Um grupo de cientistas italianos avaliou o resultado de mais de 104 mil exames orais de 19 mil estudantes universitários e descobriu que “há um pico evidente nas taxas de sucesso por volta do meio-dia”.
Os resultados académicos variam ao longo do dia, mas “os estudantes tinham mais probabilidades de passar ao final da manhã do que no início da manhã ou ao final da tarde”, afirmou o professor Carmelo Mario Vicario, director do laboratório de Neurociência Social-Cognitiva da Universidade de Messina e principal autor do estudo publicado esta quinta-feira na revista científica Frontiers in Psychology.
Ou seja: havia mais notas positivas às 12h, seguindo-se os exames feitos às 11h ou às 13h. Mas, se os exames fossem feitos entre as 8h e as 9h ou entre as 15h e as 16h, a chance de passar no exame já era mais reduzida. E talvez estes resultados não se apliquem só a exames académicos, mas também a trabalho.
“Acreditamos que este padrão se pode aplicar a entrevistas de emprego ou a qualquer processo de avaliação agendado ao longo do dia”, afirmou ainda o investigador, citado em comunicado. O investigador também refere que seria interessante investigar se as decisões de contratação “variam em termos de justiça ou resultado, dependendo da altura do dia”.
E como se chegou a estes resultados? Os investigadores analisaram dados de 104.552 exames orais, incluindo a hora e a data em que tinham sido feitos. Os exames destes 19 mil estudantes da Universidade de Messina tinham sido feitos entre Outubro de 2018 e Fevereiro de 2020 (para evitar as imposições que surgiram com a pandemia de covid-19, como os exames por videochamada) por 680 professores de 1243 disciplinas.
As instituições de ensino devem ponderar agendar exames e avaliações importantes para o final da manhã e início da tarde
Estudo publicado na Frontiers in Psychology
Avaliaram-se ainda quantos créditos é que cada “cadeira” lhes dava para excluir que a dificuldade de cada prova contribuía para esta tendência – ainda assim, há muitos dados em falta e que podem ter algum impacto, como os padrões de sono dos estudantes, o stress ou o seu ciclo circadiano (que define se são noctívagos ou madrugadores). Por uma questão de privacidade, os investigadores não tiveram acesso a dados sobre a idade, o género ou o país de origem dos estudantes.
Mesmo quando se excluem outros factores, “as probabilidades de passar no teste eram mais altas por volta da hora de almoço e mais baixas no início e no final do dia”, lê-se no comunicado do estudo. Da amostra analisada, só 57% dos exames tiveram nota positiva. Muitas das cadeiras de universidades italianas requerem uma nota positiva no exame oral. Da análise foram excluídos os exames escritos, já que muitos são feitos em casa.
Nas universidades de Itália, os exames orais estão agendados e podem durar entre 10 e 30 minutos por estudante. Os professores fazem perguntas sobre a matéria, os alunos respondem e a nota é dada no final do exame. Não há uma estrutura rígida. “Estes exames podem ser bastante stressantes devido à sua natureza imprevisível e ao peso forte que têm na evolução académica”, afirma o professor Carmelo Mario Vicario, citado em comunicado.
O grupo de cientistas inspirou-se num estudo que mostrava que os juízes tinham mais tendência a dar uma sentença favorável ao réu depois das pausas das refeições ou no início de uma sessão.
Porque é que isto acontece?
O estudo não identifica quais as razões para este padrão nos exames da faculdade, mas lança algumas pistas: as conclusões do estudo batem certo com a evidência de que o desempenho cognitivo melhora ao longo da manhã, antes de voltar a diminuir durante a tarde. Além disso, os níveis de energia dos alunos também podem levar a uma diminuição da concentração, o que pode afectar a sua performance.
Outra possível explicação é o ritmo circadiano dos estudantes: as pessoas nos seus 20 anos tendem a ser mais noctívagas, enquanto as pessoas com mais de 40 anos tendem a ser mais madrugadoras. “Os estudantes podem estar cognitivamente menos lúcidos na altura em que os seus professores estão mais alerta”, lê-se no comunicado do estudo.
“Estes resultados evidenciam como os ritmos biológicos – muitas vezes descurados em contextos de tomada de decisão – podem afectar subtilmente, mas de forma significativa, o resultado de avaliações importantes”, afirmou o professor Alessio Avenanti, da Universidade de Bolonha, co-autor do estudo.
Para contrariar esta influência, os estudantes podem tentar salvaguardar alguns factores que estão ao seu alcance: garantir que dormem as horas suficientes e com qualidade, evitar agendar avaliações importantes para estes períodos menos despertos ou fazer “pausas mentais” antes deste tipo de exames, refere o investigador Carmelo Mario Vicario.
Os professores também podem ser afectados por um fenómeno de fadiga de decisão (em que tomar demasiadas decisões ao longo do dia pode afectar a qualidade das decisões seguintes). Também há a hipótese de a fome poder condicionar a performance cognitiva.
Para melhorar o desempenho académico e ter avaliações mais justas, “as instituições de ensino devem ponderar agendar exames e avaliações importantes para o final da manhã e início da tarde”, lê-se no estudo. Quanto aos professores, reduzir a quantidade de exames por dia e permitir mais pausas também pode ser benéfico.
Os investigadores referem que o estudo tem algumas limitações e que é preciso investigação futura para perceber melhor como é o sucesso académico é influenciado por outros factores, como o estado emocional, a qualidade do sono, condições ambientais (como a luz, o barulho e a temperatura) e as notas anteriores. “Ter estes factores em conta é essencial para evitar dar demasiada importância a estes efeitos apenas com base nas variações da hora do dia.”