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As gôndolas dos supermercados estão repletas de versões “zero açúcar” de produtos. Refrigerante zero, ketchup zero, doce de leite zero… A sensação que fica é que basta não ter açúcar para que o alimento se torne saudável.
De fato, o consumo exagerado de açúcar está associado a risco de sobrepeso, obesidade, cáries e doenças crônicas, como a diabetes. É aí que o adoçante aparece como o substituto que seria inofensivo à saúde —mas não é bem assim que funciona.
Os edulcorantes (matéria-prima dos adoçantes) surgiram como uma forma de conferir sabor doce a produtos e receitas, com a promessa de ajudar no controle da glicemia e na manutenção do peso, explica Daniela Lopes Gomes, nutricionista coordenadora do Departamento de Nutrição da SBD (Sociedade Brasileira de Diabetes) e professora e psquisadora da UFPA (Universidade Federal do Pará).
Com o passar do tempo e com a adesão da indústria alimentícia, eles passaram a fazer parte da lista de ingredientes de alimentos ultraprocessados, junto a outros aditivos, como corantes e aromatizantes.
“Por causa dessa designação de light, diet ou zero, as pessoas acabaram associando [os ultraprocessados] a produtos que seriam mais saudáveis, inclusive em comparação a alimentos in natura ou minimamente processados”, diz a nutricionista.
A busca pelo emagrecimento está no centro desse cenário. “A indústria vendeu a ideia de que, para ser saudável, você precisa ser magro e, para ser magro, você não deve consumir açúcar”, relata Thelma Feltrin, nutricionista e membro da Câmara Técnica do CRN-3.
Especialistas esclarecem, porém, que não ter açúcar não necessariamente faz o produto ser saudável. “Sou contra esse terrorismo nutricional que fazem diante de alguns alimentos. O açúcar é consumido em excesso, então a ideia é diminuir, ter equilíbrio, não substituir tudo pelo adoçante”, afirma.
A mensagem dominante entre nutricionistas, nutrólogos e pesquisadores é: cautela, moderação e priorização de uma dieta natural e menos doce, em vez de depender dos substitutos do açúcar.
O que diz a ciência? Pesquisas recentes desafiam a crença de que os adoçantes seriam totalmente saudáveis e poderiam ser consumidos sem restrições.
Um estudo inédito da USP revelou que altas doses diárias podem estar relacionadas à perda de memória e ao declínio cognitivo.
Ele se soma a uma recomendação da OMS que desaconselha o uso para controle de peso e redução de risco de doenças crônicas. O que aponta a diretriz:
- A curto prazo: ensaios clínicos randomizados, na sua maioria com duração inferior a três meses, mostraram que o uso pode levar a redução do peso corporal, da ingestão de açúcares e calorias totais da dieta.
- A longo prazo: estudos observacionais, com uma média de 13 anos, associaram o consumo ao aumento do risco de diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares e obesidade.
Qual é a diferença? Ensaios clínicos randomizados são considerados o padrão-ouro porque, neles, as condições são controladas para avaliar com segurança se um efeito observado é realmente causado pela intervenção.
Já os estudos observacionais não interferem na vida dos participantes: eles acompanham grupos ao longo do tempo para identificar associações entre hábitos, comportamentos e risco de doenças. Por estarem sujeitos a variáveis, não conseguem comprovar relações de causa e efeito.
- Exemplo: uma pessoa que usou adoçante por anos também pode ter sido sedentária ou consumido muito álcool no período.
Na área da alimentação, porém, estudos observacionais são super importantes, porque grandes ensaios clínicos randomizados têm restrições éticas e logísticas. Imagine: como selecionar um grande grupo de pessoas que receberão, por anos e de forma controlada, uma substância que pode vir a causar doenças?
Então… A OMS concluiu que a ausência de evidências de benefícios a longo prazo, combinada com os potenciais efeitos indesejáveis, supera qualquer benefício de saúde do uso de adoçantes a curto prazo.
A recomendação é baseada em evidências de baixa certeza e, por isso, a ciência segue estudando os edulcorantes para tirar conclusões. Moderação e redução do consumo norteiam as recomendações de médicos e nutricionistas. Veja o que você precisa saber por enquanto:
Eles podem ser ferramentas úteis para a redução do consumo de açúcar, principalmente em pessoas com pré-diabetes, diabetes ou síndrome metabólica, argumenta Durval Ribas Filho, médico nutrólogo e presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran).
- “Os adoçantes até podem fazer parte de uma alimentação saudável, mas sua inclusão é sempre com moderação e preferencialmente com orientação profissional”, diz.
Qual o limite de uso? Esse talvez seja um dos grandes desafios, pois há uma ingestão diária aceitável (IDA) diferente para cada tipo de adoçante:
- Aspartame: 40 mg por quilo de peso corporal.
- Sucralose: 15 mg por quilo de peso corporal.
- Estévia: 4 mg por quilo de peso corporal.
- Sacarina: 5 mg por quilo de peso corporal.
- Ciclamato: 11 mg por quilo de peso corporal.
- Acessulfame de potássio: 15 mg de quilo por peso corporal.
Pessoas que têm hipertensão não devem consumir sacarina e ciclamato, pois os dois contêm sódio e podem impactar a pressão arterial, alerta Daniela Lopes Gomes. Já indivíduos com doença renal crônica devem evitar o acessulfame de potássio, segundo a SBD.
“Não tem hoje um adoçante que a gente possa dizer que é perfeito ou que tenha total segurança independente da quantidade, sem efeito colateral algum”, relata a nutricionista.
Reduzir o consumo deve fazer parte de um processo de reeducação do paladar. Veja dicas dos especialistas para evitar exageros:
Evite alimentos ultraprocessados
A pegadinha é que os produtos no mercado geralmente contam com um “blend” de adoçantes artificiais, unindo sacarina e sucralose ou sacarina e ciclamato, exemplifica Gomes. Isso faz com que você faça um uso em ainda maior quantidade.
Sua alimentação do dia a dia deve ser baseada em alimentos in natura e minimamente processados, como frutas, legumes, verduras, carnes, grãos, tubérculos e leguminosas.
Cuidado com o adoçante líquido de mesa
No Brasil, esse formato está presente em mesas de lanchonetes e restaurantes. “As pessoas perdem um pouco a dimensão da quantidade que está sendo utilizada. Você pergunta: quantas gotas costuma usar no suco ou café? O paciente não sabe responder, porque usa em jatos”, relata Gomes.
Não exagere nas bebidas “zero”
Por não ter calorias, bebidas ultraprocessadas sem açúcar parecem um caminho seguro, mas podem fazer você extrapolar o consumo de adoçantes. E lembre-se: elas continuam sendo ultraprocessadas.
Pior ainda se fizerem você consumir menos água do que o recomendado. Não substitua a ingestão de água por refrigerantes ou chás industrializados. Se quiser diversificar, aposte em chás naturais, águas aromatizadas (com frutas, hortelã) ou sucos de fruta (sem açúcar, nem adoçante).
Encontre estratégias para reeducar o paladar
Trabalhar o paladar para se acostumar com sabores menos doces é importante. Nesse sentido, vale fazer um esforço pelo sabor natural dos alimentos. Evitar adoçar o que já é doce, como um suco de abacaxi ou laranja, é um primeiro passo importante.
Essa redução pode acontecer gradativamente e não precisa ser radical, explica Thelma Feltrin. Se você usa, por exemplo, duas colheres cheias de açúcar ou adoçante no café, pode tentar reduzir para uma.
“A gente não é mais saudável se sair do açúcar e for para o adoçante”, diz a nutricionista. “Saudável seria uma alimentação variada, diversificada, colorida, com todos os grupos alimentares, inclusive açúcar, se quiser, mas em quantidades pequenas.”
O que você precisa saber
Notícias sobre saúde e bem-estar
Vacina contra o VSR. O Ministério da Saúde anunciou que irá fornecer no SUS, a partir de dezembro, o imunizante que protege gestantes e bebês do vírus sincicial respiratório. Devem se vacinar gestantes a partir da 28ª semana de gravidez. A vacina, aplicada em dose única, oferece proteção aos recém-nascidos.
Vulnerabilidade dos idosos no Brasil. Um novo levantamento, conduzido com 400 idosos no bairro do Belenzinho, na zona leste de São Paulo, encontrou uma prevalência de quedas de 63%, muito acima da média global, estimada de 25% a 33%. O estudo foi publicado na Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia.
Riscos do sedentarismo. Um levantamento da Socesp (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo) mostra que 33,5% dos paulistas não sabem que a falta de atividade física é um risco para o coração; 28,7% não praticam nenhum exercício ao longo da semana e 32,8% se exercitam apenas duas vezes no período. A pesquisa ouviu 1.765 pessoas no estado.