Dormir com uma luz acesa – seja um abajur, a TV, o corredor iluminado ou até a claridade que entra pela janela – é mais comum do que parece. Para algumas pessoas, essa pequena luminosidade traz conforto, reduz a sensação de solidão ou alivia memórias antigas do medo do escuro. Para outras, funciona como uma “companhia silenciosa” nos momentos de ansiedade.
Mas, embora o hábito tenha um lado emocional compreensível, a ciência tem mostrado que ele pode impactar profundamente o sono, o funcionamento do cérebro e até a saúde cardiovascular.
Por que tanta gente dorme com a luz acesa?
Desde a infância, a claridade sempre foi associada à proteção. Luzes noturnas eram usadas para afastar medos, facilitar a ida ao banheiro ou ajudar na transição para dormir sozinhos. Na fase adulta, esse padrão pode persistir como resposta a ansiedade e estresse; sensação de vulnerabilidade; necessidade de recriar um ambiente acolhedor; conforto emocional em lugares novos; crenças culturais ligadas à proteção contra energias ou superstições.
Para muitos, uma luz suave cria a impressão de que “alguém está ali”, o que diminui a sensação de isolamento. Mas o corpo não interpreta essa claridade da mesma forma que a mente – e isso traz consequências.
Como a luz interfere no organismo
A luminosidade noturna desorganiza o ritmo circadiano, o relógio interno que controla sono, vigília, hormônios e metabolismo. A luz (especialmente a azul, emitida por telas) inibe a liberação de melatonina, hormônio essencial para o início do sono profundo. Quando essa regulação se desajusta, podem surgir dificuldade para adormecer, despertares frequentes, sensação de cansaço pela manhã, menor qualidade do sono REM e profundo. A longo prazo, dormir com luz acesa aumenta o risco de insônia, alterações metabólicas, oscilação de apetite e até problemas emocionais.
Dormir com luz acesa
Um estudo que acompanhou quase 89 mil pessoas por mais de nove anos mostrou algo preocupante: quem dormia em ambientes iluminados tinha maior risco de desenvolver infarto, insuficiência cardíaca e arritmias. Pequenas fontes de luz, como o brilho da TV ligada, notificações do celular ou um abajur, também foram suficientes para atrapalhar o corpo.
Isso porque a exposição noturna à claridade impede que o coração “desacelere” como deveria durante o sono. Este fator aumenta a frequência cardíaca, pressão arterial e respostas inflamatórias no organismo. Com o tempo, esses estímulos se somam e favorecem doenças cardiovasculares.
Além disso, pesquisas apresentadas nas Sessões Científicas de 2025 da Associação Americana do Coração reforçaram ainda mais o alerta. Os cientistas analisaram exames cerebrais, imagens de satélite e dados sobre luminosidade nas casas dos participantes. O objetivo era entender como a luz artificial noturna afeta o corpo por dentro.
Os resultados chamaram a atenção: pessoas expostas a maior quantidade de luz à noite tinham mais atividade cerebral relacionada ao estresse; também apresentavam inflamação nas artérias; o risco de problemas cardíacos aumentava de 35% a 22% em acompanhamentos de cinco e dez anos; e regiões mais vulneráveis socialmente sofreram impactos ainda maiores.
Como reduzir os impactos da luz na hora de dormir
Para quem sente dificuldade em dormir totalmente no escuro, há alternativas seguras:
- Use luzes de baixa intensidade: o ideal são tons quentes (laranja ou vermelho) que interferem menos na melatonina;
- Evite telas antes de dormir: celular, televisão e tablet são fontes fortes de luz azul;
- Aposte em cortinas blackout: elas bloqueiam a luz externa sem necessidade de iluminar o quarto por dentro;
- Crie um ritual de relaxamento: mindfulness, respiração profunda e leitura leve ajudam a desligar o sistema nervoso;
- Faça higiene do sono regularmente: rotina estável sinaliza ao corpo quando é hora de desacelerar.
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