Um dos maiores especialistas em nutrição desmonta três mitos sobre o metabolismo e explica porque acelerar este processo não faz emagrecer mais rápido – nem garante a perda de peso

Acha que acelerar o metabolismo é a chave para perder peso? O metabolismo tornou-se uma das palavras da moda na indústria do bem-estar, um código complicado que, se decifrado, se acredita que revelará os segredos da perda de peso e da saúde em geral.

Apesar da ubiquidade do termo, um cientista afirma que muitas pessoas não compreendem muito bem o modo de funcionamento deste processo corporal básico.

“Pensam que tem algo a ver com a quantidade de comida que podemos comer sem engordar ou algo do género”, afirma Kevin Hall ao correspondente médico-chefe da CNN, Sanjay Gupta, no seu podcast “Chasing Life”.

Hall quer aumentar o metabolismo por diferentes razões. “O metabolismo é um processo bioquímico incrível que basicamente transforma os alimentos que ingerimos e o oxigénio que respiramos em essencialmente… tudo o que somos e tudo o que fazemos”, aponta.

Kevin Hall, um cientista de renome especializado em nutrição e metabolismo, é conhecido pela sua investigação, com concorrentes do reality show “The Biggest Loser”, que ajudou a explicar o que distinguia os participantes que conseguiam manter o peso perdido daqueles que voltavam a ganhá-lo.

Ele passou mais de duas décadas nos Institutos Nacionais de Saúde (NIH). O seu trabalho mais recente sobre alimentos ultraprocessados investigou a sua ligação com a obesidade, incluindo um estudo que demonstrou que estes levavam os participantes a comer em excesso.

Em abril, Hall anunciou a sua reforma antecipada e saída dos Institutos Nacionais de Saúde, alegando ter sido alvo de censura relativamente à forma como os resultados da sua investigação estavam a ser comunicados. Agora, é coautor do livro Food Intelligence: The Science of How Food Both Nourishes and Harms Us (Inteligência Alimentar: A Ciência de Como os Alimentos Tanto nos Nutrem Como nos Prejudicam), em parceria com a jornalista Julia Belluz.

Embora o metabolismo e a perda de peso andem de mãos dadas, segundo Hall, esta ligação pode ser redutora.

“Às vezes, acho incrivelmente frustrante que esta ideia de metabolismo, um processo fisiológico realmente extraordinário e tão fundamental para a vida, seja abordada como: ‘Bem, se tomar este suplemento, pode aumentar o seu metabolismo e perder peso'”, explica a Gupta.

Pode ouvir o episódio completo aqui.

Será que um metabolismo mais rápido ou acelerado é realmente o caminho mais rápido para a perda de peso? Hall está aqui para esclarecer as coisas, destacando três ideias erradas sobre o metabolismo que mostram que a realidade é mais complexa do que parece à primeira vista.

Mito 1: Pessoas com obesidade têm o metabolismo lento

É comum acreditar que um metabolismo mais lento resulta num peso corporal mais elevado. No entanto, na maioria dos casos, segundo Hall, acontece o contrário.

“Geralmente, as pessoas com uma constituição física mais robusta têm um metabolismo mais rápido do que as pessoas mais pequenas”, explica a Gupta.

Hall atribui a prevalência deste mito à forma como os investigadores elaboraram os primeiros estudos sobre o metabolismo. Inicialmente, os cientistas tentaram correlacionar a ingestão calórica dos participantes com o seu peso, mas não levaram em consideração o facto de as contagens calóricas terem sido comunicadas pelos próprios participantes no estudo.

Constatou-se que as pessoas com obesidade indicavam consumir menos calorias do que realmente ingeriam, numa proporção superior à das pessoas mais magras. Segundo Hall, isto “levou à conclusão de que, se elas comem menos calorias e mantêm o peso, então devem estar a queimar menos calorias. E talvez a razão pela qual são obesas seja terem um metabolismo lento”.

A tecnologia moderna permite agora aos investigadores basearem-se em dados concretos e não apenas nos relatos dos participantes. “Ao medirmos diretamente o metabolismo das pessoas, verificamos que, em média, os indivíduos com obesidade apresentam taxas metabólicas mais elevadas do que as pessoas magras”, observa Hall.

Ainda assim, o mito de que é necessário acelerar o metabolismo para tratar a obesidade continua a persistir – e, por vezes, já teve consequências fatais. Na década de 1930, quando investigadores da Universidade de Stanford descobriram que o composto químico 2,4-dinitrofenol, ou DNP, aumentava os níveis de metabolismo, promoveram-no entusiasticamente como uma ferramenta segura e eficaz para tratar a obesidade.

Embora o DNP aumentasse efetivamente o metabolismo, também causava efeitos secundários que incluíam cegueira e morte, levando as autoridades reguladoras federais a retirá-lo rapidamente do mercado.

“Talvez não seja de estranhar que, com algo tão fundamental para a vida como o metabolismo, não se possa simplesmente aumentá-lo ou diminuí-lo com um medicamento sem esperar efeitos secundários bastante graves, incluindo a morte”, sugere Hall.

Mito 2: O metabolismo abranda com a idade

Tal como acontece com o peso, a idade pode não influenciar tanto o metabolismo como se pensa.

“Na verdade, até idades bastante avançadas, por exemplo, 70 ou 80 anos, tudo indica que a nossa taxa metabólica permanece mais ou menos constante”, afirma Hall.

Existem, claro, alterações no corpo ao longo do processo de envelhecimento que podem afetar as taxas metabólicas.

As pessoas “com mais de 30 anos tendem a perder massa muscular e a ganhar massa gorda”, explica Hall. “E isso, por si só, já é suficiente para resultar num metabolismo mais lento”. Isto porque a massa muscular magra queima mais calorias do que a gordura.

Mas são estas mudanças relacionadas com a idade – que não são inevitáveis – e não a idade em si, que influenciam o metabolismo de uma pessoa.

“Quando eliminamos esse fator… não parece haver um efeito fundamental do envelhecimento que, por si só, abrande o metabolismo à medida que envelhecemos”, conclui Hall.

Algumas formas de combater a perda de massa muscular magra à medida que envelhecemos são a prática de treino de força duas vezes por semana e a ingestão de proteína suficiente (mas sem exageros).

Mito 3: É necessário ter um metabolismo acelerado para perder peso

Outro pilar da mitologia do metabolismo é a ideia de que um metabolismo lento é inimigo de uma perda de peso continuada. Acredita-se que intervenções como as dietas podem abrandar o metabolismo a tal ponto que se torna impossível continuar a perder peso.

No entanto, segundo Hall, evitar o abrandamento do metabolismo não é a chave para manter a perda de peso. Na verdade, é precisamente o contrário.

“As pessoas que têm mais sucesso em perder peso e mantê-lo são aquelas que apresentam o metabolismo mais lento ou as maiores reduções no metabolismo”, explica. “É como esticar uma mola, certo?”

Quanto mais intensamente alguém faz dieta ou exercício, mais peso perde e mais o seu metabolismo abranda, explica Hall no seu livro.

A investigação de Hall mostrou que um metabolismo mais lento “não parecia determinar a capacidade de alguém de perder peso ou mantê-lo a curto ou longo prazo”.

Ao dissociar o metabolismo da conversa sobre perda de peso, Hall afirma esperar que todos possam apreciar o fenómeno pelo que ele realmente é.

A desinformação sobre o metabolismo “distraiu as pessoas da verdadeira beleza do fenómeno”, diz a Gupta.

“É o aproveitamento constante do fluxo de matéria e energia presente nos alimentos e no ar que respiramos, e que alimenta cada célula do nosso corpo, bem como os corpos e células de praticamente todos os organismos que já encontrámos”, explica Hall. “É um componente fundamental da vida e é absolutamente fascinante.”