O secretário de Estado Adjunto da Presidência e da Imigração garantiu esta segunda-feira que o Governo vai acomodar o chumbo do Tribunal Constitucional (TC) às alterações a cinco normas da Lei dos Estrangeiros, mas deixou críticas veladas à decisão dos juízes do Palácio Ratton e lembrou que Portugal é “o único país sem prazo para o reagrupamento familiar”.

Em declarações ao programa Explicador, da Rádio Observador, Rui Armindo Freitas notou que as alterações propostas visam impor “regras para responder a este momento demográfico em Portugal”. Vincou também que a intenção de fixar um prazo mínimo de dois anos de permanência legal em território nacional até que um titular de autorização de residência possa submeter um pedido de reagrupamento familiar está em linha com a prática noutros estados-membros da União Europeia.

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“Podemos olhar para o contexto da União Europeia, sendo Portugal o único país sem prazo para o reagrupamento familiar”, assinalou o governante, justificando a lógica dos dois anos: “Quando estamos a falar de um prazo, queremos que se estabeleça um vínculo laboral estável. (…) Se toda a gente acha que introduzir um prazo é desumano, então todos os países da UE são desumanos, porque têm todos prazo”.

Rui Armindo Freitas defendeu também que o reagrupamento familiar pode continuar a ocorrer de forma automática, ao dar o exemplo de um casal que vem trabalhar legalmente para Portugal e que pode trazer os seus filhos, e deixou críticas ao TC e aos partidos que eram contra o diploma aprovado no Parlamento em julho por PSD, CDS-PP e Chega.

“Na realidade, se estamos hoje a regularizar centenas de milhares de pessoas, o reagrupamento familiar terá a tendência de aumentar, porque hoje já podem pedir o reagrupamento que lhes foi vedado durante anos em Portugal e em que ninguém se importou com isso. (…) Ninguém se escandalizava com o facto de termos deixado vir pessoas indocumentadas e entregues à exploração e à indignidade“, referiu, enfatizando: “O chegar a Portugal e logo se ver depois como se integra acabou com este Governo”.

De acordo com o governante, o Estado tem de estar preparado para receber com condições os imigrantes, o que “não aconteceu durante anos”, apontando aos anos de governação socialista de António Costa.

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Sobre os passos seguintes ao chumbo anunciado na sexta-feira pelo TC, Rui Armindo Freitas destacou que “esteve longe de ser uma decisão unânime”. Sem querer comentar as críticas do vice-presidente do tribunal, Gonçalo Almeida Ribeiro, em que este juiz conselheiro considerou que a maioria dos colegas deixou contaminar a apreciação constitucional das normas pelas suas próprias “convicções pessoais”, Rui Armindo Freitas recusou ver o chumbo como uma derrota do Governo.

“Não sinto que isto seja uma derrota, de todo. Ao longo dos anos tem havido várias fiscalizações preventivas e nem por isso se deixa de corrigir”, indicou, acrescentando: “Iremos observar as chamadas de atenção e as bases disso. O objetivo é ter leis que se possam aplicar no país na prática. Aquilo que estamos a propor está conforme a diretiva comunitária. Teremos de acomodar, mantendo sempre o destino das nossas políticas”.

Questionado sobre uma eventual negociação com outros partidos, como o Chega ou o PS, sobre a reformulação das alterações à Lei dos Estrangeiros, Rui Armindo Freitas ressalvou que a proposta surgiu “independentemente de qualquer partido” e que a regulação da imigração é uma prioridade.

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“A questão não tem que ver com negociar, existe um racional por trás que tem que ver com a realidade que se vive no nosso país. Com a nossa proposta, vamos tentar que seja o mais fiel possível ao que propusemos”, observou. O governante enfatizou também a necessidade da vinda de imigrantes “de forma segura e regulada” para o país. “Tentaremos ser rápidos, porque o país precisa mesmo de regras que se compadeçam com a nossa realidade”, complementou.

Já sobre o desembarque dos 38 migrantes na sexta-feira à noite na praia de Boca do Rio, em Vila do Bispo, e a consequente decisão de afastamento do território nacional emitida pelo tribunal de Silves para os 31 migrantes que já foram presentes a juiz, Rui Armindo Freitas considerou que a situação foi um exemplo de aplicação de regras com humanismo.

“Ficou bem claro para todos que podemos ter regras e executá-las com humanismo. Portugal é um Estado de direito e, com este Governo, as regras são para cumprir“, reiterou, explicando que o processo de expulsão será mais rápido para os estrangeiros que chegaram com documentos.

“Temos vindo a chamar a atenção para as alterações às questões do retorno. Percebe-se agora a necessidade de ter a polícia de fronteira. Temos envolvidas no processo de retorno uma série de entidades e agora será um processo muito mais eficiente e rápido”, referiu.

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O secretário de Estado rejeitou especular que o Algarve possa tornar-se uma nova rota migratória e deixou novamente algumas ‘farpas’ aos anteriores executivos do PS pelo que considerou ser a inação em questões de resolução dos problemas na imigração.

O que acontecia em Portugal era o alimentar das rotas secundárias de migração. Há um ano e meio, o que sucederia com a manifestação de interesse é que todos poderiam preencher uma manifestação de interesse depois de chegar e ficavam legais”, concluiu.

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